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sábado, outubro 09, 2010

Uma onda pode recuperar uma cidade?

Super Tubos - Peniche - Portugal

Cem milhões de euros - poderá ser este o valor de uma onda? Para um surfista como Pedro Bicudo, professor na Universidade Técnica de Lisboa, descer uma massa de água em cima de uma prancha até vale mais que isso. É terapia e saúde. Mas quando ficamos pelas contas, nos estudos que tem levado a cabo, a conclusão é imediata (e talvez arrojada). "Se contabilizarmos em Peniche 100 mil turistas por ano e a possibilidade de cada um gastar 1000 euros por semana, podemos chegar a esse valor." Numa altura em que a economia portuguesa tem o selo da austeridade colado na testa, a discussão em torno do economia do mar foi recuperada esta semana, a propósito da realização do Rip Curl Pro Peniche, a oitava etapa do campeonato do mundo de surf, onde o Turismo de Portugal entrou na organização com cerca de meio milhão de euros, um terço do custo total da prova.
Kelly Slater e companhia estão em Peniche apenas por uma razão, a onda dos Supertubos. Chamam-lhe a Pipeline da Europa, uma maravilha natural à altura da que existe no Havai, a meca do surf. Enquanto ouvimos a intervenção de Pedro Bicudo, num debate organizado a meio da semana, as escolas de surf que proliferam como cogumelos pela península a norte de Lisboa descarregam dezenas de turistas, loiros e pálidos, em busca da primeira cor e da primeira experiência nos Supertubos. Muitos acabarão por nunca lá surfar, porque não chegam a ter o nível suficiente para tal, e divertem-se em ondas mais acessíveis. Mesmo assim, é a marca Supertubos que os atrai. No total, existem em Peniche 12 escolas federadas (e em Portugal são já 153, fora as que não estão certificadas). "Cada uma pode chegar a cobrar 500 euros por semana, por aulas, estada e uma sanduíche ao almoço. Depois há os gastos extra de cada um", explica ao um dos envolvidos no negócio. 

Voltemos ao debate. "A onda dos Supertubos é um fenómeno natural que funciona como bandeira, atrai turistas que a querem surfar. Se a onda desaparecesse, os turistas não viriam. Esta onda é como o monte Branco dos Alpes", continua Pedro Bicudo. Ao seu lado, Pedro Adão e Silva, politólogo e surfista, carrega: "Temos de produzir bens que os chineses não saibam imitar e que os alemães não saibam produzir com maior qualidade. O que não podem imitar e produzir é uma onda como os Supertubos. Isso é impossível."

De Peniche à Figueira Mas estaremos a falar de algo tão evidente, perceptível para quem está nesta onda e estranho para quem está de fora? Talvez não. Em Peniche, a determinada altura, a escolha pôs-se entre a preservação dos Supertubos e a construção de um porto de águas profundas. "Venceu a primeira", decidiu o presidente da Câmara Municipal, António José Correia. Na Figueira da Foz a salvação da onda do Cabedelo tornou-se questão política, a partir do momento em que começaram as obras no porto comercial e as condições naturais na zona ficaram ameaçadas. A comunidade local reagiu, nasceu o movimento SOS Cabedelo e hoje o projecto de de-senvolvimento da cidade está traçado em função daquela que é uma das melhores direitas do país (onde ainda há bem pouco tempo houve uma prova organizada pela ASP, a FIFA do Surf). A cidade virou-se ao mar. Como em todo o lado, há quem apareça na Figueira apenas para surfar e ir embora, mas um turista que queira ficar ali uns dias pode gastar "entre 80 e 100 euros por dia", explica Eurico Gonçalves, da SOS. 

Regressemos a Peniche. Um estudo do Instituto Politécnico de Leiria, feito no ano passado, depois da realização do Rip Curl Pro, assegurava que 51,5 % dos visitantes de Peniche procuravam eventos associados a ondas ou ao surf. Na amostra, metade dos inquiridos eram estrangeiros.

O mercado espanhol e dos países do Centro e Norte da Europa tem o poder de compra e o interesse suficiente para dar um salto à costa portuguesa. "Temos um clima temperado e condições para o surf durante todo o ano. Além disso estamos perto. É mais fácil apanhar o avião em Londres para Lisboa que ir à Indonésia ou à Austrália", lembra Pedro Adão e Silva.

Entre as análises mais apaixonadas ou mais reticentes, o impacto real do surf está em avaliação. Os estudos são raros e a importância desta indústria, um "cluster" na economia do mar - como o definiu ex-ministro das Finanças Ernâni Lopes -, tem impacto mais fácil de avaliar na facturação das marcas especialistas ou associadas a este negócio. "As nossas vendas foram muito boas no ano passado", disse ao i José Farinha, general manager da Rip Curl em Portugal. No nosso país, só a Quiksilver factura 10 milhões de euros por ano. A marca que em 1990 se associou a Kelly Slater, o melhor surfista de todos os tempos, cresceu para se tornar o quinto maior operador mundial a nível desportivo, apresentando hoje um volume de negócios na ordem dos 2,3 mil milhões de euros. Só na Europa são 600 milhões de euros por ano.

Por estes dias, o negócio é potenciado em Peniche e a cidade agradece a ocupação hoteleira, ou o negócio da restauração em andamento, mesmo quando a chuva já não descola e o frio começa a sentir-se. E nem que seja apenas por estes dias o desemprego baixa ligeiramente - só a organização da prova foi buscar mais de 30 funcionários ao centro de Emprego. 

Fonte Extraída: http://www.ionline.pt

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